Botucatu, terça-feira, 29 de Abril de 2025

Colunista Nelson Ferreira Junior Professor de Língua Portuguesa/Redação
25/09/2018

O machismo e um pouco de semântica



Somos machistas! Em níveis diferentes, mas somos. Somos homens, mulheres que vivem em uma sociedade onde a valorização masculina em detrimento do feminino está incrustada em nossa consciência de maneira que, muitas vezes, sequer percebemos. São milênios de dominação ideológica masculina que dificultam nossa compreensão do fato. Nossos pensamentos e percepções estão estruturados em conformidade com a relação de dominação masculina que nos é imposta, fazendo com que nosso conhecimento seja a submissão ao pensamento dominador.

Nascemos em uma sociedade na qual muitos acreditam em um Deus que fez primeiro o homem e depois a mulher para que lhe fosse companheira. A crença é a de que Deus fez o homem à sua imagem; ou seja, o homem é a imagem de Deus, mas a mulher não. Não conseguimos ver que Deus não é masculino. Nós damos um sexo a Deus, como se este possuísse um sexo.

A semântica, o estudo da significação, pode nos revelar uma compreensão melhor deste fenômeno da dominação simbólica. Quando vamos nos referir ao ser humano, podemos substituir essa expressão pela palavra homem; mas não podemos substituir pela palavra mulher. Nosso idioma possui palavras masculinas e femininas, assim o feminino de deus é deusa. Acontece que Deus não possui sexo, portanto não se trata de um ser masculino, porém a palavra que usamos para designá-lo é uma palavra masculina, e, assim, interiorizamos essa relação.

Até nossas roupas podem nos influenciar. De acordo com nossa cultura, homens não usam saias, trata-se de uma vestimenta feminina. O homem, ao usar calças, possui a liberdade para sentar-se da maneira que lhe convier; já a mulher não. Ela deve cruzar as pernas pelo fato de estar usando saia. Portanto o homem tem liberdade; à mulher resta o aprisionamento, a submissão.

Ao criticar um homem que batia na esposa, o ex-presidente Lula, em 2016, perguntou onde estavam as mulheres de grelo duro de seu partido, o PT, para fazerem uma manifestação contra o criminoso. Embora a expressão usada por Lula seja para elogiar as mulheres corajosas, porque significa mulher de fibra, que possui atitudes, ela carrega um simbolismo de dominação masculina, pois se refere ao clitóris, órgão sexual feminino, mas com um adjetivo (duro) que remete ao órgão sexual masculino. Assim, o elogio, na verdade, carrega a ideologia de superioridade masculina, uma vez que a mulher de fibra é aquela que possui uma característica do corpo masculino.

Esse tipo de ideologia deve ser compreendido e extinto, todavia, como é quase invisível, requer tempo e muita reflexão. O machismo que requer urgência para deixar de existir é aquele que se manifesta de maneira direta e cujo sujeito age conscientemente com o objetivo de inferiorizar a mulher. Um bom exemplo, atualmente, é o machismo do candidato à presidência da República Jair Bolsonaro. O postulante ao cargo mais importante do país é a favor de o setor privado, ao contratar seus funcionários, ter a liberdade de pagar um salário menor a mulheres, mesmo que desempenhem a mesma função de homens. Ainda que o candidato não aceite ser chamado de machista, sua atitude coloca o homem como superior.

A reflexão deste texto deve ser feita com qualquer tipo de preconceito. Machismo, homofobia, transfobia, racismo, gordofobia, xenofobia, elitismo, preconceito linguístico... Nosso mundo está inserido em um consciente coletivo carregado de ideologias, falsas concepções de realidade que nos fazem preconceituosos. Precisamos compreendê-las para que possamos extingui-las. Um bom começo é repudiando os preconceitos que conseguimos visualizar.










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