Quatro horas após a renúncia, o prefeito pediu ao Legislativo para que reconsidere o ato, alegando que havia entrado em "parafuso", falou sobre as dificuldades de administrar uma cidade e revelou que as manifestações de apoio lhe deram força para continuar
Matéria publicada no JCNET e assinada pela jornalista Lilian Grasiela realça que em meio ao desgaste emocional gerado pela descoberta de um desvio milionário nos cofres do município por parte de uma servidora (leia texto abaixo), o prefeito de Santa Cruz do Rio Pardo, Otacílio Parras Assis (PSB), reeleito no ano passado com mais de 77% dos votos válidos, renunciou nessa terça-feira (14) ao mandato. Quatro horas depois, ele recuou e pediu a reconsideração da renúncia. Como o pedido já havia sido protocolado na Câmara, os vereadores irão se reunir hoje para avaliar a legalidade jurídica do retorno de Assis ao cargo.
A decisão de abandonar o mandato foi anunciada pelo prefeito em reunião realizada com alguns servidores de confiança no final da manhã. Logo depois, o então chefe do Executivo seguiu para a Câmara, onde protocolou carta de renúncia. Na sequência, em entrevista à Rádio Difusora AM da cidade, justificou a decisão alegando abalo emocional e descrença nas pessoas.
"Comecei a ver só o que as pessoas têm de bom. Deveria ter visto também o que as pessoas têm de ruim, que não consegui enxergar", declarou. "Esse talvez tenha sido meu erro. Você tem que ver a parte ruim das pessoas. E eu não consegui enxergar isso. Talvez isso tenha atrapalhado um pouco a administração e me levado a esse cansaço mental e psicológico".
Assis disse que todos os envolvidos no desvio de recursos públicos devem ser punidos. "Eu espero que as pessoas abram os seus corações e falem a verdade", cobrou. "Eu sei que estou pagando pelo erro de outras pessoas. Estou ficando em um estado emocional tal que está ficando difícil de administrar. Então, é melhor sair para não atrapalhar a administração".
O vice-prefeito de Santa Cruz do Rio Pardo, Benedito Batista Ribeiro (PT), também chegou a dar entrevista à mesma emissora de rádio comentando a decisão. "Eu jamais pensei em ser prefeito da cidade em uma situação dessas", revelou. "A gente tem que respeitar a opinião dele (Assis). Eu estou aí para colaborar e espero que ele volte atrás disso ainda".
Reviravolta
Após uma tarde de intensa movimentação por parte de políticos e populares, sobretudo nas redes sociais, quatro horas após a renúncia, o prefeito pediu ao Legislativo para que reconsidere o ato. Ele disse que havia entrado em "parafuso", falou sobre as dificuldades de administrar uma cidade e revelou que as manifestações de apoio lhe deram força para continuar.
"Mas o que mais me convenceu a continuar não foram as manifestações de apoio e o apoio dos vereadores. O que mais me convenceu a continuar é a manifestação de regozijo da oposição. As manifestações de sorriso e alegria daqueles que são contra a administração é que me convenceram a não sair porque eles vislumbraram voltar à 'Casa da mãe Joana'", alegou.
Lei Orgânica
Segundo o assessor parlamentar José Eduardo Piedade Catalano, a Lei Orgânica de Santa Cruz do Rio Pardo diz que o mandato do prefeito é extinto e essa extinção é declarada pelo presidente da Câmara quando há "renúncia expressa" ao mandato.
"Considera-se formalizada a renúncia e como tendo produzido todos os seus efeitos para fins de extinção do mandato quando ela é protocolada na secretaria da Câmara", explica, citando trecho da legislação municipal.
"Ocorrido e comprovado esse fato extintivo, o presidente, na primeira sessão, comunicará o fato ao plenário e fará constar da ata a declaração de que o mandato foi extinto, convocando o substituto legal para a posse".
A formalização da renúncia de Assis deveria ocorrer na próxima sessão ordinária, marcada para segunda-feira (20). Com o protocolo do pedido de reconsideração, Catalano explica que o procedimento será diferente.
"Ele reconsiderou a renúncia e pediu que fosse aplicada a legislação federal pela qual só depois de constar em ata da reunião da Câmara é que se confirma a renúncia. Então, esse documento vai ser enviado para a sessão de segunda-feira e, se aprovada a colocação desse documento na ata, vale a reconsideração dele", esclarece.
Reunião
O presidente da Câmara, Marco Antonio Valantieri (PSDB), conta que os vereadores irão se reunir nesta quarta-feira (15) para analisar o caso. "Nós temos um trâmite jurídico do Regimento Interno e também da Lei Orgânica que, a partir do momento em que o prefeito faz a renúncia e ela é protocolada na secretaria da Câmara, não tem volta", afirma.
"Mas tem também uma lei federal que acaba contestando esse entendimento. Amanhã (hoje) a gente vai fazer um levantamento com o procurador jurídico e a assessoria parlamentar e buscar mais informações. Eu acredito que tem como reverter".
Rombo milionário
Sueli de Fátima Feitosa é suspeita de desviar mais de R$ 7 milhões. Quando as irregularidades foram descobertas, em dezembro de 2016, ela foi exonerada do cargo em comissão que exercia e afastada de suas funções por 30 dias. Sindicância foi aberta e a Polícia Civil passou a investigar diversos crimes. Sueli e familiares tiveram bens sequestrados e, desde 8 de fevereiro, ela está presa preventivamente. Relatório final da sindicância determinou abertura de processo administrativo para demitir a servidora.